Filme Livre: uma curadoria em processo
“I. Que espécie de
esperança tem no amor?
L. Se amo, toda
esperança. Se não amo, nenhuma.”
Luis Buñuel (Inquérito
surrealista)
Após 10 anos de
curadoria da Mostra do Filme Livre(MFL), pensei em criar algo novo, considerando
uma lacuna entre a realização e curadoria (lembrando que todos os curadores da
MFL são também realizadores de cinema e vídeo), e uma ausência de textos
críticos, no sentido de apontar não apenas os melhores filmes vistos, mas algo
nunca feito antes, tentar dar um retorno, criar resenhas, textos que de alguma
forma procurem traduzir o que pensei e senti em cada filme, cada trabalho de
longa ou média metragem enviado para seleção na mostra de 2013. Um dos critérios foi a escrita
automática, buscando dar transparência as idéias e coisas sentidas em tempo
real, ao ver e as vezes rever os
filmes. Palavra, som,
imagem e montagem. E,
claro, a busca de uma livre articulação entre
tema/forma/andamento/conclusão(não estou muito certo deste último). Talvez aí
esteja uma das chaves: a MFL é uma das poucas mostras de cinema no Brasil que
tentam valorizar o filme pela sua busca, não necessariamente por sua conclusão,
pela obra acabada. Por isso nunca fizemos questão de anunciar prêmio técnicos
(melhor montagem, melhor fotografia, etc). A tecnocracia da dita indústria
criativa aqui não tem vez. É claro que é um desejo utópico: mesmo que
conseguíssemos traduzir os pensamentos de todos os filmes, de desconhecidos (a
grande maioria), conhecidos, amigos e inimigos da área (ou melhor seria dizer:
do campo de batalha), sempre faltaria algo a decifrar; algum pensamento perdido
em forma de poesia ou metáfora, sonhos e delírios, fantasias , enfim, o que
estava a fim de escancarar / transbordar em escrita automática é uma conversa
aberta com os realizadores de todos os filmes inscritos. Enfim, publicar
abertamente idéias sobre filmes, adivinhações e leituras, não como uma prestação de contas
burocrática, no sentido de pontuar e avaliar como “bons” ou “ruins” este ou
aquele filme, mas abrir um espaço
de diálogo entre a curadoria da mostra e os diretores dos filmes. Este pensamento surge a partir da
constatação de que vivemos um momento de “êxtase” dos editais (públicos ou
privados) e o boom dos festivais de
cinema, mas que no entanto, temos muito pouco diálogo entre curadores e/ ou
comitês de seleção com os cineastas/proponentes. Vale acrescentar: diálogo não como politicagem/conchavos/lobbys/formação de quadrilha (dependendo
da quadrilha acho até válido), mas diálogo como espaço de liberdade de opinião.
E se ao mesmo tempo a escolha dos filmes passa por razões subjetivas penso que
de certa forma faz parte do trabalho do curador refletir sobre o processo de criação de cada obra (e quando possível,
publicar estas idéias), independente da
seleção ou exclusão dos trabalhos em qualquer mostra ou exibição pública.
Realizadores e
produtores de filmes que acreditam na Mostra do Filme Livre (a ponto de
inscreverem seus filmes e acreditarem na sua direção e curadoria) sintam-se
privilegiados: penso que este é o
primeiro festival (digo, mostra) de filmes no Brasil que está abrindo este
diálogo.
Vale lembrar que, antes de tudo,
que a MFL é uma Mostra com licença poética.
Chico Serra
PS. As resenhas e textos estarão
disponíveis em breve neste blog.
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