quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

MOSTRA DO FILME LIVRE - CURADORIA EM PROCESSO PARTE 1


1. a lenda da lagoa vermelha II - terror clássico (i.e. decupado classicamente), mas acaba beirando mesmo o trash rural. interessante, mas a passagem "de época"  com aquela historia dos escravos dá uma ralentada no ritmo, que ia bem ate então…terror folk, falc, trash ou naif ? 


2. indubitável reggae documento! - começa muito bem com um blend de imagens de arquivo da cena jamaicana dos anos 70, cenas de filmes importantes como "Rockers" (1977), "The Harder They Come" (1974), além de criadores e gênios totais (Lee Perry), mas a coisa desanda quando a transição para a cena brasileira rola sem um filtro, como se as bandas underground bazucas de ska/skacore/reggae/dub tivessem o mesmo peso que as gringas (jamaicanas e inglesas) que as inspiraram.  Falta uma contextualização da colonização musical jamaicana no Brasil (o doc se restringe a entrevistas com bandas da cena paulista e uma breve retrospectiva dos grupos Rappa e Cidade Negra). Uma breve introdução do nyahbinghi no Brasil. Apesar de um pouco obscuro, filmado de forma meio displicente e com depoimento de apenas um dos integrantes, revela uma tentativa abordagem da ancestralidade musical e cultural jamaicana no Brasil. Funciona como programa de TV punk / udigrudi, pelo despojamento estético. 



3. Alice Diz: - Web drama/pseudo-sci-fi. Jovem yuppie se envolve com uma desconhecida em chat da internet e acabava levando a pior ao descobrir que trata-se de um programa científico, e a tal desconhecida é apenas uma máquina. A dialética da vida real versus mundo virtual não convence por conta do elenco fraco e roteiro pretensioso.


4. Pixoação - documentário manifesto pró pixoação…movimento que mistura rebeldia urbana e arte visual.  numa tentativa de depoimento sobre a "evolução" do grafite, um personagem apela pro grafite "voltar a ilegalidade" , falando também de "integração(???)" e "respeito"…
inclui dezenas de clipes de pixacoes inusitadas e shockantes.
num outro depoimento, uma pixadora afirma que está "representando o seu rolê…" seriam estes seguidores de Bob Cuspe?
documentário que futuramente será documento quase antropológico de um certo tipo social, o pixador da megalópole.

5. inacabado o teatro e a cidade
fórmula de  documentário de curta ou media metragem brasileiro:
1. junte fotos p&b de arquivo de uma referência arquitetônica/personalidade/
fato histórico. 2. procure uma figuraça entrevistável facilmente por câmera quadrada e incauta. 3. selecione para  entrevistas pessoas bem sucedidas política ou culturalmente, que falem português claro e correto e ao fundo escolha obras de arte requintadas, refletores ou se preferir uma biblioteca. 4. peça verba a prefeitura ou governo mais próximo com a justificativa de que seu filme é uma obra de "resgate de memória"  5. leve ao forno pré aquecido por contatos(imediatos ou não) , ou leve  ao banho maria, a escolher. pronto ! agora é só aguardar o resultado do edital…

depoimentos de um semi-institucional sobre a história trágica do teatro inacabado de goiânia.

6. no fundo nem tudo é memória
depoimentos a luz de lamparina e as memórias de um diretor fascinado por seu filme e memórias de moradores de uma cidade perdida repetição nao leva a um interesse maior pois a redundância é constante….no final descobrimos que a cidade existiu e foi inventada, e o diretor tinha um sonho desde criança…


7. republica o filme comedia de costumes sobre universitários q dividem republicas no masculino e feminino.
boas piadas e bons atores. daria um bom programa de verão na tv aberta...

8. teus olhos meus
apesar da misenscene novelesca, é uma espécie de edipo rei GLBT as avessas…vale a pena ver até o final…

9. cartas para angola
filme processo sobre as relações entre brasileiros e angolanos…poético e político ,com alguma invenção em sua fotografia e montagem. através de cartas e vídeos, personagens do brasil e angola dialogam e filosofam sobre o outro lado do atlântico…
independencia e afetos,laços culturais ,  historias de familias e trajetórias pessoais, memórias e amizades se cruzam nestes encontros escritos ou gravados,  possibilitados pelo doc. porém, depoimentos começam a perder fôlego da metade pro final.
mas ainda assim interessante…

10. luzeiro volante a eletricidade é o condutor desta trama sem trama, sem drama e improvisada entre a marginalidade e o medo da morte, entre jesus e o acaso. o filme dentro do filme é um exercício poético, um on the road a pé (cinema de garagem sem garagem) que as vezes transborda o narciso, mas tem belos planos conduzidos com leveza e como diria dellani lima, com momentos iluminados de "baixa dramaturgia…", onde a quase não direção é a direção…

11. marcas das ruas ii - a pixação e sua relação com a cidade. doc tosco que aborda tema interessante e polêmico:"guerrilha artística?",afirma um entrevistado.
acrobacias impressionantes nos prédios de sao paulo. eh um filme radical,mas também,por outro lado, eh quase um institucional sobre a pixação…


12. Cine Holliudy
Produção razoavelmente modesta(com com alguns globais) e voltada para uma certa tradição de humor do Ceará. As aventuras de uma família que tenta sobreviver com um cinema mambembe numa cidade do interior do nordeste, numa época marcada pela chegada da televisão. A precariedade da sala de cinema é compensada pela criatividade do protecionista e dono do cinema Francisgleydisson em narrar a continuação de um filme que é interrompido por problemas no projetor. Cinema, vida e imaginação aqui se misturam.


13. balança mas não cai
uma espécie de edifício master experimental…histórias e memórias de moradores de um antigo edifício em belorizonte que está prestes a ser derrubado,desocupado,reutilizado para outros fins imobiliários/urbanisticos. mas nao existe nenhum filme de protesto, talvez um lamento pela barbárie do estado (e outros poderes,enfim),de subtrair toda uma memória coletiva, ligada aos anos 60(comenta-se da ditadura, de prisões e testemunhos de confrontos entre polícia e manifestantes,no centro de bh). o que significa revitalizaçao imobiliária de uma determinada região da cidade pode significar para alguns uma aniquilação de uma referencia de morada, desconstrução de uma memória afetiva.

as psicodélicas intervenções entre alguns depoimentos saudosos de ex-moradores do edificio e os maneirismo das fusões deixa o filme na fronteira  entre o experimental e o documental. me incomoda os depoimentos em off do diretor, que funciona como uma "explicação" de algo que não precisava ser explicado. A falta de humanismo na relação com os personagens, que estão sempre distantes da câmera, imóveis, tenho a impressão que estão  quase sempre enquadrados como "parte do cenário" do edifício em desconstrução. a memória e os escombros…livre e irregular.


14. atrizes 3.5
um filme de planos seqüência, estruturado na tensão dramática da atriz/metacinema?
longo demais pra curta. vale pela extensão dramática da interpretação e uma leve fantasmagoria.


15. umbanda

documentário quase institucional sobre terreiro de umbanda localizado em itaipuaçu. quase didático, funciona como um guia para iniciantes. como documentário, peca pela tom educativo e com extensas explicações sobre os aspectos da religiosidade e dos rituais. Curioso pela abertura da casa em autorizar a entrada da câmera nas giras e ritos de iniciação.


17. reggae na estrada 2.5
minidoc sobre rãs bernardo,primeiro vocalista do cidade negra e ativista do reggae na baixada fluminense.parece ser uma serie televisiva,mas me agrada bastante,embora não seja um filme livre no sentido formal.

18. A primeira vez do cinema brasileiro.
cine-reportagem sobre o primeiro filme pornô brasileiro:
aventuras e desventuras de um cineasta marginalizado, que tentou a sorte grande na boca do lixo e acaba esquecido e marginalizado,como tantos outros. vale pelas memórias dos técnicos que participaram do filme/marco zero do pornô brasilis.

19. Terra de fé
doc institucional sobre a festa de devoção a nossa senhora do bonsucesso, em mogi das cruzes.
bem realizado tecnicamente mas carece de inventiva na abordagem de um tema já bem rodado, e segue o padrão entrevistas/versão oficial do tema etc e ainda abusa da liturgia católica nas citações e montagens musicais...mas enfim, a diocese é uma dos produtoras então o institucional que mencionei acima se justifica. inclui uma sequencia de folia / congada / marujada com cânticos populares e um dos maiores hits catolicos brazucas; ave maria.

20. Jóia de Copacabana
doc sobre a tal sala de cinema de arte em copa, levanta algumas bandeiras pertinentes relativas a destruição dos cinemas de rua em geral e da dialética do cinema comercial versus o cinema de arte e a internet e os tempos globalizados com a cultura do cinema de rua. merece atenção pela iniciativa, levando em conta a ausência de salas alternativas que exibem filmes fora do padrão roliúdi.num dado momento se torna quase institucional sobre o novo cine jóia, com registros de exibições de filmes e debates.

21. Semana Santa

Montagem paralela da encenação da paixão de cristo na semana santa no interior de minas com um grupo de católicos (um pseudo-arcebispo e seus padres /assessores) em situações surreais a la luis bunuel. uma seqüência musical na piscina é apenas interlúdio pornochanchadistico marginal (homenagem a russ meyer), sem conexão com o discurso rebelde anti-católico do filme, ou talvez como contraponto anarco-sexual a repressão católica. a seqüência final dos fiéis na montanha ao entardecer é uma das mais belas vistas nesta temporada de filmes livres.  filme irregular mas que deixa claro seu deboche a representação e as convenções católicas.


22. o anjo

família feliz de propaganda de margarina em ficção espírita invisível.serio concorrente a melhor invisível do ano. 0.1

23. burro morto - batista virou máquina - trilha visual do disco homônimo, dialética homem versus máquina, sinergia homemaquina, orgasmo industrial visual, trabalho, lazer,sonho, trabalho. filme ou clip? fotografia e direção de arte inspiradas e tavinho teixeira foi ótima opção para  o kafkiano papel de batista.


24. pau brasil
arvore da vida no sertão. o machismo e o anti-machismo do interior nordestino brasilis. a mistica da arvore/entidade como elemento anunciador dos destinos, o caminho e a cura.
a arte entalhada na madeira por um bertrand duarte contrito e genial na sua transexualidade imaginada em sonho. a chave da transição, um manifesto pela doçura do macho em contraponto ao moralismo caboclo bem brasileiro.uma sutil poética feminina transborda neste obra pouco vista do cinema baiano.

25. lacuna
um estudo do tempo. da transição. o filme parte de personagens reais e ficcionais em situações isoladas para construir uma idéia de movimento/busca. uma professora de pilares perde emprego e participa de uma performance violenta de contato e improvisação. um documentarista investiga os escombros de casas a beira de um mar revolto.editor trabalha num vídeo institucional da polícia(?). power trio tenta construir uma unidade musical a partir de sons atonais. a busca de uma harmonia/construção de um filme como uma música improvisada.


26. a porta larga
doc sobre centro que trabalha com detentas que acabaram de dar a luz, feito na base de entrevistas, relatando histórias trágicas e testemunhos emocionados. tem momentos que é bem cansativo.  o filme é todo gravado dentro do centro de detenção…e tem uma sensação de opressão/claustrofobia que eh ate interessante.destaque para cena da dança coletiva do funk "Créeeeeeeu"!.o problema é que a seqüência do momento da apresentação de teatro com as detentas vira teatro filmado e torna o filme longo demais…


27. outro olhar
ficção/ thriller político. um seqüestro de um filho de deputado em campanha é o pretexto da trama que abusa do drama psicológico. usa e abusa também das gírias da favela num contexto de luta armada neo-realista(???)….bons atores mas excesso de clichês atrapalha…há uma tentativa de discurso sobre luta de classes e uma critica a corrupção nas campanhas politicas. irregular.




28. Em busca de um lugar comum
desvela engrenagens e diferentes possibilidades do mercado de turismo nas favelas, entre o ponto de vista do turista e o dos
guias de turismo, que levam os grupos para diferentes favelas do rio, em contextos e situações sociais distintas . Entre os longos passeios pelas vielas e becos das favelas e "slide shows" de fotografias de turistas em favelas e pontos turísticos mundiais, lugares-comum de uma filosofia do turismo,  revela uma exploração de uma situação social miserável e ao mesmo tempo a  possibilidade do potencial econômico  deste ramo (alinhadas a um projeto da instalação de postos de polícia  pacificadora nas favelas). Os contrastes entre as favelas "maquiadas" em contextos de olimpíadas e copa do mundo revelam tambem a visão critica de alguns guias mais antenados com a situação local, "Behind the scene, the favela is still the same", fala um dos personagens, levando turistas para a Rocinha. a seqüência da visita de inspeção de turismo na cidade de deus é bizarra.


29. tava a casa de pedra
video nas aldeias. investiga a trajetória guarani a partir da participação na construção dos templos na época das 'colônias jesuítas'. a lembrança do processo da igreja católica em tentar persuadir os guarani com sua crença única a despeito dos mitos e crenças próprias dos guarani eh um ponto tratado com atenção neste manifesto guarani contemporâneo.



Por Chico Serra

Um comentário:

  1. Parabens pela iniciativa! se todos fizessem o mesmo seria ótimo, nenhum festival dá a menor satisfação aos filmes que se inscrevem e não são selecionados, pra quem faz o filme é ótimo ter o retorno dos curadores, vou inscrever meu filme na MFL 2014!

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